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GEMOMA | RELATÓRIO - Reunião 12/04/2021

GEMOMA 1/2021

12/04/2021



Friedrich Engels – A situação da classe trabalhadora na Inglaterra – Capítulo As grandes cidades - pág. 67-87


Contextualização da obra – primeira metade do século XIX (1845). Jovem Engels descreve sua experiência de viver com a classe trabalhadora e compreender a sua existência. Para os estudos da moradia o livro é um texto essencial. O livro está inserido em um contexto em que o debate sobre a pobreza das camadas trabalhadoras urbanas era comum entre “reacionários e conservadores, liberais e democratas, reformadores e revolucionários” que se dedicavam a esta “questão social”.


É nesta obra que pela primeira vez:

  1. A revolução industrial ganha a centralidade que de fato lhe cabe para a compreensão de como o capital passa a controlar a produção de mercadorias;

  2. A solução da “questão social” deixa de estar hipotecada à filantropia, à moralização da sociedade ou à realização de receitas utópicas idealizadas por mentes generosas, porque compreendida como implicação necessária do padrão societário embasado na propriedade privada dos meios de produção fundamentais;

  3. O proletariado não comparece como massa indiferenciada, sofredora e passiva - põe o proletariado, o trabalhador urbano-industrial, enquanto classe, como sujeito revolucionário, qualificado para promover a sua auto-libertação.

A história da classe operária inicia-se na segunda metade do século XVIII com a revolução industrial. Como a Inglaterra constitui-se como o terreno clássico desta revolução, é também o país em que se deu o desenvolvimento do proletariado. “Somente na Inglaterra o proletariado pode ser estudado em todos os seus aspectos e relações” (p. 45).

A principal causa desta transformação foram as novas técnicas (máquina de tear e a vapor) que resultaram no nascimento das grandes cidades industriais e mercantis do Império britânico.


A urbanização é objeto de um dos capítulos do livro em Engels que coloca a olho nu o horror da realidade urbana.

Os ingleses tiveram que sacrificar a melhor parte de sua condição de homens para realizar esses milagres da civilização, entre eles a cidade. Retrata a degradação da humanidade e a atomização do mundo levada às últimas consequências. Guerra de todos contra todos – explicitamente declarada – homens só se consideram reciprocamente como objetos utilizáveis, cada um explora o outro. Enquanto para muitos – os pobres – resta apenas a vida. Nesta guerra, as armas são o capital e a propriedade direta ou indireta dos meios de subsistência e dos meios de produção.

O autor faz um exame detalhado das condições que a guerra social impõe à classe que nada possui. “Vejamos que salário, sob a forma de habitação, vestuário e alimentação, a sociedade paga de fato ao operário por seu trabalho; vejamos que existência assegura àqueles que mais contribuem para sua existência – e observaremos primeiro a habitação”.


Ao observar as cidades Engels compreende: o que é verdadeiro em Londres é também nas outras cidades. Descreve os “bairros de má fama”, onde se concentra a maior parte da classe operária. Pequenas casas habitadas até o porão, com péssimas condições sanitárias: sem rede de esgoto, porões úmidos, ruas com lama – exemplos página 70, 79.

Cita uma tendência que é a destruição destes bairros para abertura de vias largas, novos prédios e etc. Utiliza de notícias de jornais, relatos de padres, médicos e etc. O que gera a segregação e decomposição do centro.

Não são todos os operários que vivem nessas condições, mas uma boa parte sim. Descreve também a situação dos sem teto que dormem nos alojamentos ou ruas. Apresenta dados: Liverpool 1/5 dos operários moravam em porões; em Bristol 46% das famílias viviam em um único cômodo; em Glasgow 78% da população era a classe operária que vivia em bairros de miséria.


Três elementos característicos da indústria moderna: aproveitamento das forças da natureza, substituição do trabalho manual por máquinas, divisão do trabalho ao extremo. É a ordem capitalista que gera o caos urbano.

Engels aponta a dupla tendência centralizadora do capitalismo: a concentração demográfica em paralelo com a concentração do capital.


Debate


Questão do racismo / preconceito / xenofobia em Engels e/ou discurso moral, moralizante sobre as pessoas que vivem nas condições de moradia precária, que legitima uma determinada identidade depreciativa, “degradada”, como característica inerente a elas


Condena o lugar e as pessoas. Preconceito e racionalidade do urbanismo


Primeiro, sobre a questão de Engels ser racista / preconceituoso / xenófobo em suas descrições, indico o vídeo a seguir, que se refere mais propriamente a Marx (respondendo a outras polêmicas, que não a nossa) mas que acho que nos ajuda a pensar o Engels: https://www.youtube.com/watch?v=fpmj-EkvNWs&t=36s


Contudo, é importante levar em conta que, como conversamos, esse Engels é um Engels ainda bastante jovem, ainda iniciando sua parceria teórica e política com Marx, e o materialismo histórico e dialético ainda começando a se desenvolver e não em sua fase já amadurecida. Nesse sentido, é certo que será mais fácil verificar "escorregadas" idealistas (como o próprio Engels reconhece no prefácio à edição inglesa que apresentamos no grupo. Mas isso não impede que ele esteja corroborando com concepções racistas da época, próprias de sua nacionalidade, classe social de origem, "senso comum" social, etc.


Além disso, reforço que precisamos separar o que é ironia, o que é descrição (e a descrição pode ser ruim, como "ladrões", mas é a descrição de uma realidade), e o que é uso das palavras do adversário (como "bairros de má fama", que Engels apresenta a primeira vez que a utiliza entre aspas) para o uso provisório de uma ideia que ele irá evidenciar suas contradições. Isso implica em termos um maior conhecimento do contexto do texto, do momento do autor, etc.


Outro tema de debate foi a importância do relato que demonstra a barbárie, a exploração direta e que causa também indignação e perplexidade. É possível observar as nuances do desenvolvimento das forças produtivas e a miserabilidade.


Atualidade do debate que descreve problemas também atuais como a invisibilidade dos moradores de rua. Referência ao livro O cortiço que apresenta uma realidade semelhante em relação à moradia, e também aos estudos sobre a formação dos cortiços no Rio de Janeiro. A cidade como elemento integrador e a segregação. Engels introduz temas atuais como: multidão solitária e da atomização, a problemática da rua.


Relação da industrialização com a urbanização. Engels não identifica a cidade como uma simples desordem, doença ou mal, é uma ordem específica – a da produção industrial gerida pela burguesia – gera, segundo Engels uma desordem específica: a desordem urbana.



Indicação da Bruna Bessi: Nabil Bonduki, Origens da habitação social no Brasil. Sobre como esse discurso legitima remoção e violência


Indicação Prof. Marcus Orione: Neil Davidson, Desenvolvimento desigual e combinado: modernidade, modernismo e revolução permanente.



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