GEMOMA | RELATÓRIO - Reunião 26/04/2021
GEMOMA 1/2021
26/04/2021
Capitalismo e Urbanização - Maria Encarnação Sposito – pag. 42 a 75
Apresentação do texto
Publicado pela primeira vez em 1988 e escrito por Maria Sposito, pesquisadora brasileira da área da Geografia, o livro, de forma didática, resgatará o estudo histórico das cidades, entendendo as determinantes econômicas, sociais, políticas e culturais do espaço urbano. Além disso, desenvolverá conceitos sobre os impactos, nas cidades, da relação entre a industrialização e a urbanização.
No tópico sobre a emergência do trabalho assalariado (pg. 44), a autora vai mostrar como os artesãos e camponeses recorrem à manufatura e como o fenômeno da etaperização do trabalho fez com que essas pessoas perdessem a noção de completude do processo de produção dessas mercadorias.
Quando a autora comenta sobre a Revolução Industrial (pg. 47), demonstra-se a maneira pela qual a burguesia, nesse momento histórico, utiliza-se de seu acúmulo de capital para o desenvolvimento das máquinas e da produção em larga escala. A autora vai citar as duas formas de se extrair um maior valor da mais-valia: diminuição do salário dos trabalhadores e o aumento da carga de trabalho. Além disso, tem-se uma incessante atuação para o desenvolvimento tecnológico e das máquinas, com o objetivo de se ter mais lucro e produzir mais em menos tempo.
Ainda, será traçado um paralelo entre a industrialização e o crescimento populacional urbano (pg. 48), demonstrando que, na urbanização, ocorreria um aumento da população que vive em cidades em relação à população total. Nesse sentido, analisa-se que o desenvolvimento técnico-científico e o desenvolvimento industrial fizeram com que a urbanização tomasse ritmos elevados na sociedade europeia do século XIX, não sendo maior a taxa de crescimento populacional urbano devido ao alto nível de mortalidade.
Após isso, é realizada uma reflexão sobre as cidades depois da revolução industrial (pg. 50), demonstrando que não houve apenas uma mudança na quantidade de pessoas, mas, principalmente, na própria estrutura interna das cidades. É central, neste momento, a mudança da produção artesanal para uma produção industrial, havendo a passagem para um capitalismo industrial ou concorrencial. A autora mostrará as diferenças entre as cidades europeias, em que algumas já tinham uma infraestrutura mais desenvolvida. Expõe, também, que algumas cidades foram criadas através das indústrias – exemplo da indústria metalúrgica, que “criava” cidades ao seu redor.
A autora explica a ultraespecialização do trabalhador e a divisão socioespacial das cidades, já que, em determinados lugares, produzia-se apenas alguns tipos de produtos. Com isso, consolida-se uma subordinação entre as cidades, a partir de uma rede urbana, responsável por uma hierarquização entre as cidades (pg. 54). Esse processo de subordinação de uma cidade à outra foi responsável pela produção em larga escala e a constituição do consumo em massa, com uma homogeneização sob a esfera do domínio capitalista.
Problemas urbanos (pg. 55), nova forma de relação social baseada na propriedade privada. Crescimento desordenado das cidades, precariedade das habitações. Características principais do liberalismo, sem a intervenção do poder público, tornaram as cidades um espaço caótico. Mostra que, a partir da metade do século XIX, houve a aprovação de algumas leis sanitárias, que não davam respostas adequadas às necessidades das cidades.
A autora vai, também, demonstrar a passagem de um capitalismo industrial concorrencial para um capitalismo monopolista (pg. 61). No capitalismo monopolista, os amplos investimentos realizados pelos capitalistas acarretaram um grande desenvolvimento técnico e reforçaram as suas posições no mercado, o que inviabilizou a entrada de novos capitalistas, minando um dos preceitos do capitalismo, a livre-concorrência. Um ponto importante que a autora vai apresentar é que trabalhadores do mundo inteiro recebem quantias diferentes para produzirem riquezas de mesmo valor.
Quando comenta sobre a urbanização nos dias de hoje (pg. 63), a autora irá expor que a cidade continua sendo a concretização e a materialização do capitalismo monopolista. Nesse sentido, que a cidade reúne tanto os aspectos qualitativos quanto os quantitativos para o desenvolvimento industrial, mencionando que o campo também “sucumbiu” à lógica capitalista de consumo e de produção, com latifúndios em grande escala. No momento em que a autora fala sobre as cidades nos dias de hoje, ela expõe como o capitalismo monopolista foi responsável pelo aumento de “especialistas”, na medida em que, em uma mesma fábrica, é possível encontrar executivos que ganham até 50x que o salário dos operários. Interessante notar como a diferença salarial se refletiu no próprio nível urbano, com áreas residenciais divergentes (pg. 66 - 67).
No ponto sobre o desenvolvimento desigual (pg. 67), serão apresentados os conceitos de um país desenvolvido, subdesenvolvido e em desenvolvimento, demonstrando como esses conceitos são responsáveis por criar um ideal falacioso de etapalização do processo histórico, entendendo, erroneamente, que a história seria linear, progressista e evolutiva. Com a noção desses conceitos, cria-se a ideia de que um país em desenvolvimento um dia se tornaria um país desenvolvido, ignorando-se que, para a perpetuação e desenvolvimento do capitalismo monopolista, é necessária a articulação entre os países, na medida, inclusive, em que o processo de industrialização, na Europa, só foi possível em razão do acúmulo de capital próprio do pacto colonial.
A autora menciona, neste ponto, novamente os problemas urbanos (pg. 70), retratando o problema da moradia. Demonstra como a questão do acesso à moradia digna não está ligada à falta de casas ou à construção de mais casas, mas sim ao impasse de que muitas pessoas não possuem condições de pagar pela terra.
Debate
Cidades no Capitalismo
Questão das cidades no capitalismo. Questiona-se se a ideia de cidade, tal como conhecemos, não seria uma construção social, específica e historicamente datada do capitalismo.
A relação entre a industrialização e a urbanização é decisiva para se pensar a cidade até hoje. A partir dessa questão, é feita uma reflexão que nos leva ao fato de que a cidade existe antes do capitalismo, mas que, no capitalismo, ela passa a ter muitas especificidades. Por isso, é preciso partir do método materialista histórico-dialético, olhando “do futuro para o passado”, de forma a compreender que a cidade, no capitalismo, terá uma forma específica, abrangendo, também, o espaço de produção.
Diferenciação entre o urbano e a urbanização, em que a cidade urbana teria existido há muito tempo, mas que o processo de urbanização diria respeito ao capitalismo. Com a compreensão da cidade no capitalismo, conseguimos perceber como é assumida uma forma mercadoria, que dialoga com o processo de homogeneização das cidades.
Nesse sentido, a cidade materializa o modo de produção capitalista. Apesar das transformações da cidade, nós observamos os resquícios das cidades anteriores ao capitalismo (por exemplo, a cidade, durante o período escravista, deixou resquícios no espaço urbano – essa transição não acontece de maneira a “romper” com o espaço). Esses resquícios são ressignificados no capitalismo.
Ainda, falamos sobre a estratégia do Estado de uma arquitetura do espetáculo, ao mesmo tempo em que as cidades carecem de estrutura urbana, para que sejam atraídos investimentos de capitais (indicação do livro de Pedro Arantes). Utilização dessa arquitetura do espetáculo para tornar um edifício atrativo para os capitais, não apenas por ele em si, mas pelo que ele significa (a marca), de ideal de modernidade. Esse fenômeno explica o alto investimento em edifícios ou atrações, ao mesmo tempo em que as cidades apresentam problemas de infraestrutura.
Debatemos, também, a especialização funcional das cidades, com a consolidação de uma hierarquia urbana, havendo uma subordinação das cidades. Indício da cidade como produção, atomização dos indivíduos e, também em relação ao território, de dependência e subordinação. Reforçamos aqui o processo da mercadoria refletida espacialmente, assumindo a cidade, no capitalismo, uma forma bastante específica. São três os níveis desse processo: o nível individual, dos indivíduos tornados sujeitos atomizados e hierarquizados, o nível das indústrias e o das cidades, em que essa lógica se reproduz.
Planejamento urbano e atuação do Estado
Percepção dos limites da atuação do Estado em relação ao planejamento urbano. Importante a leitura de ser o Estado uma forma política do capitalismo, na medida em que age como representante político do capital.
Estado vai ter uma atuação na questão dos problemas urbanos, mas ele agirá ou não a depender dos interesses do capital. O conteúdo do planejamento urbano, das políticas públicas e do Direito, por conta da luta de classes, está em disputa, mas é importante ter em mente que a transformação da estrutura das cidades não se dará pelo Estado (ou se dará por uma outra forma de Estado, em um processo revolucionário, que use o Estado de forma transitória).
Conversamos sobre a aparente imparcialidade e neutralidade do Estado, que faz parecer que os instrumentos de gestão poderiam ser neutros, na medida em que o Estado se coloca “acima” dos conflitos, quando, obviamente, não se tem uma neutralidade. A própria ideia de uma cidade “desordenada”, ou de um planejamento urbano que não chega em alguns lugares, entra nesse debate, na medida em que a própria atuação do Estado é avaliada segundo uma lógica da desordem (indicação de um texto do Kowarick).
Dentro dessa questão de suposta imparcialidade do Estado, é possível olhar o Minha Casa Minha Vida, capitaneado pelas grandes construtoras. No programa, houve a fixação de um valor máximo de imóvel, sem uma preocupação com a infraestrutura e com o entorno (a depender da faixa, também, varia a preocupação com a infraestrutura, mas sem alterar o entorno). Partindo de uma lógica do lucro, as construtoras podem construir onde elas preferirem, buscando um terreno mais barato.
Instrumentos brasileiros legislativos para pensar a ordenação das cidades (Estatuto das Cidades), papel do Estado de regularizar esses espaços. Critérios administrativos não são tão maleáveis para ler o impulso capitalista pelo espaço. Problemas urbanos como consequência da construção do espaço urbano, sob a lógica capitalista, em que qualquer melhoria no espaço urbano seria feita para melhorar as condições de reprodução da força de trabalho (ajuda a pensar tanto o planejamento urbano como o Direito). Belém – Portal da Amazônia – retirada de moradores – uso dos instrumentos do planejamento urbano para a reprodução do capital.
Conversamos sobre a questão do planejamento urbano das cidades e se a desordem não seria a própria a ordem do capitalismo. Papel dos planos no planejamento urbano, entendendo que, para que seja possível operacionalizar um plano, o Estado precisa direcionar investimentos, e essa é uma escolha.
Textos: Arquitetura na era digital-financeira: Desenho, canteiro e renda da forma (Pedro Fiori Arantes); São Paulo 1975: Crescimento e Pobreza (coletânea de textos, dentre eles A lógica da desordem, do Kowarick).
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