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GESEMA | RELATÓRIO - Reunião 06/05/2021

GESEMA 1/2021

RELATÓRIO – 4ª REUNIÃO 06/05/2021


Texto: SILVA, Júlia Lenzi. Para uma análise crítica além da universalidade: forma jurídica e previdência social no Brasil. Tese (Doutorado). São Paulo: USP, 2019 (p. 69-87).


Presentes: Adriana da Conceição, Andressa Ruiz, Bruno Correa, Cleison Castro, Deise Lima, Eugenia Rigoni, Francine Oliveira, Gabriela Rocha Gomes, Gabriela Camargo, Hendriky Lima, Isabella Padrão, João Conceição, José Ricardo, Júlia Lenzi, Ligia Fiani, Marcus Orione, Maria Luiza Bastos, Monalisa Campelo, Nayara Bueno, Pablo Angelim, Renan Pugliesi, Rodrigo Pereira, Saula Rebeca, Silas Ramos.


Pontos do Texto: o modo de produção capitalista contém dois pilares, a categoria liberdade (ausência de coerção extraeconômica) e a categoria igualdade, pois o trabalhador, por meio da forma jurídica, é colocado como um proprietário livre e igual. Para que essas categorias basilares não sejam comprometidos, surge o Estado (forma política do Capital), terceiro neutro que detém o uso legítimo da força e que medeia as trocas mercantis, razão pela qual se sobrepõe e se distancia das classes (autoridade pública e guardião do interesse comum). Com essa forma política, o poder político está afastado do poder econômico, sendo importante a separação entre a sociedade civil e Estado, esfera pública e esfera privada, direito privado e direito público – esse visa a preservação das relações capitalistas, preservação a qual está colocada nos direitos sociais, que buscam relações simétricas (igualdade e liberdade), mascaram os conflitos de classe, estão ligados ao estágio de desenvolvimento do modo de produção capitalista e suas demandas, bem como operam sobre uma lógica de ajuste e de garantia dos custos da produção e reprodução da força de trabalho. Com essa separação, a forma apreensível pelo poder estatal é a forma cidadania (carapaça que possibilita a livre circulação da mercadoria força de trabalho, preservando os sustentáculos da forma jurídica), a qual medeia o encontro entre sociedade civil e Estado, processo esse que é representado pela oferta de políticas públicas (caracterizadas pela doutrina tradicional como um elemento humanista, de proteção aos trabalhadores), as quais garantem a continuidade da reprodução da mercadoria força de trabalho, transformam todos em beneficiários [deixam de ser trabalhadores] e descaracterizam o aspecto de conflito social. A previdência social é determinação central para a perpetuação do modo de produção capitalista, ao expor a igualdade jurídica como derivação da equivalência mercantil.


Comentários: o debate sobre a liberdade se perde na caracterização do trabalhador como um escravo (que não tem uma liberdade plena), pois não seria uma liberdade real (o debate sobre se é realmente livre essa escolha não deve perder o foco de uma coerção meramente econômico no campo do capitalismo). A liberdade existe enquanto elemento de comercialização da força de trabalho (os contratos e os empregadores são mutáveis), dinâmica de realidade essa que confere efetividade à liberdade. Em tese, qualquer um pode demitir seu patrão e empreender (condição de autoexploração). Nas realidades periféricas, a violência enquanto estrutura política ainda subsiste, como exemplo, em Franca, ainda se prende por vadiagem – o arsenal jurídico que empurra os trabalhadores livres para o trabalhado assalariado precisou ser construído, sendo que a violência é adotada pelo capitalismo para condicionar a existência das pessoas ao trabalho assalariado, assim, quando falta trabalho assalariado, utiliza-se da coerção econômica e da violência institucional para que essa força de trabalho sobrante (exército de reserva, que controla o valor da força de trabalho) continue obediente.


Comentários: a liberdade, no direito, é traduzida em autonomia privada – autonomia individual, que cada um detemos, e autonomia coletiva, que é do sindicato ou de entidades coletivas (quanto mais direitos sociais nós temos, mais força têm os sindicatos, as entidades coletivas e de defesas de trabalhadores). Sempre que o direito fala em liberdade, tende a maximizar esse conceito de autonomia privada, um exemplo é a reforma trabalhista, que deixa o trabalhador mais livre para negociar diretamente com o patrão. Quando se tira a autonomia privada individual, normalmente, joga-se a autonomia privada coletiva como forma de sustentar as autonomias privadas no bojo delas. O conceito de autonomia privada é sempre um conceito para o qual tenta emergir de forma plena o sujeito de direito.

Ainda, a gente trabalha a liberdade como conceito burguês. Tanto que, o Presidente Bolsonaro defende a plena aplicação do art. 5º, que são as liberdades individuais, o que tem sentido na conformação do Estado de Direito liberal – sendo que os direitos fundamentais sociais não têm o mesmo status dos direitos fundamentais individuais.

Não se defende a inexistência de liberdades individuais, porém, no âmbito de um Estado que se monta em liberdades individuais, é possível a existência de direitos fundamentais sociais, ou seja, é possível a instauração de outra liberdade onde há liberdade burguesa? A liberdade burguesa (que é insuficiente para avançarmos) não deve ser suprimida, mas sim potencialização (na ideia de proteção coletiva). Não é possível a plena liberdade sindical, principalmente em países periféricos.

Desconstrói-se conceitos e faz-se uma lógica de conceitos que não existem, por exemplo, ditadura do proletariado (passagem para uma sociedade sem classes possibilitada por uma classe, a classe trabalhadora, que não tem a necessidade material de se manter sempre no poder), que aparentemente seria o contrário de liberdade burguesa, contudo, historicamente, não se sustenta esse contraditório, pois o conceito não é mesmo. A liberdade burguesa tem como contraditório o que é dado pela própria dinâmica especifica do modo de produção capitalista (correlato conceito contrário burguês necessariamente).


Comentários: com relação à ideia “a generalização das relações sociais [...]” (p. 69-70), é interessante como os idosos acreditam não serem útil, vez que não configuram mais como força de trabalho, estando na condição de exclusão – construção social que se baseia em uma ideologia capitalista, pois se não participa das relações de troca (quando a pessoa é livre), o sujeito é marginalizado.


Comentários: quem não tem emprego é marginalizado. Marx crítica o trabalho no capitalismo. Usar a tecnologia para as pessoas trabalharem menos.


Comentários: obra cinematográfica “À nós a liberdade”. Contraposição entre a prisão e a fábrica (compulsoriedade do trabalho).


Comentários: o momento de maior troca é o da vitalidade, que deve se extrair o máximo para a produção. A previdência é um instrumento de incentivo para que o trabalhador continue trabalhando, inclusive as medidas associadas à perda da qualidade de segurado obrigam esse a continuar trabalhando/produzindo. Contudo, quando chega o momento da aposentadoria, o sujeito é considerado um estorvo (para que ele continue sendo usado como força de trabalho), saindo de uma situação de liberdade para uma de dependência do Estado e da sociedade.


Comentários: obras cinematográficas “Eu, Daniel Blake” e “Você não estava aqui”. Condensam o debate sobre o trabalhador que deixa de ser produtivo e a liberdade do trabalho. Diferença entre a classe trabalhadora que se está aposentando e a que está iniciando – os idosos carregam em sua subjetividade marcas do trabalho concreto, enquanto a subjetividade dos trabalhadores de hoje é mais “fluída”, sendo que o trabalhado abstrato impossibilita a solidariedade de categoria e a acentuação da liberdade e da igualdade possibilita a máxima exploração.


Comentários: ideologia não como visão de mundo.


Comentários: direito a partir da forma, com viés marxista. Nesse sentido, entende-se a ideologia não como algo produzido pelo pensamento ou abstrato, mas ligado à prática material e a reiteração dessa na produção de nossa vida. O modo de produção capitalista é o modo de produzir a nossa vida material, necessariamente a reiteração dessas práticas implicam em formas de pensamento (não abstratas) ligadas à própria materialidade.


Comentários: é comum adotar a ideologia a partir do seu viés subjetivo (como ocultamento da realidade), que está mais ligado ao conteúdo. Contudo, a partir dos pressupostos trabalhados, adota-se a ideologia da perspectiva objetiva, como a própria realidade, reiteração dos atos, das práticas, dos fazeres e dos saberes que possibilitam a reprodução das relações sociais de produção. Isto é, ideologia jurídica como nossa vivência – nascemos como sujeitos de direito (primeira documentação é a certidão de nascimento, que possibilita o ingresso no circuito de trocas mercantis sem se utilizar do sujeito de direito), inclusive, quando todos os seus direitos são violados, você ainda é sujeito de direito.


Comentários: a partir do comentário do Renan, sobre idosos associados a ideia de imprestabilidade, isso está ligado a uma série de práticas em que o prestável é quem está no circuito de trocas. Aumento da ideologia no sentido das práticas. Independentemente da negação subjetiva e individual, há a continuação e reiteração das práticas. Por isso, a revolução têm um momento específico e é coletiva (se individual, há a frustração, que é um elemento da ideologia jurídica).

Com relação ao comentário do Rodrigo da semana passada, sobre trabalho excedente e trabalho necessário, o que faz a exploração é o trabalho excedente, só que há um elemento específico da relação trabalho necessário e excedente, pois no trabalho necessário faz-se gestões para o aumento do nível de excedente criado, por exemplo, mais-valor relativo, produtividade em jornada de trabalho. Ainda, se a luta de classes não tiver em seu “pico”, o valor do trabalho necessário é reduzido.


Comentários: a ampliação dos direitos sociais teriam influência na diminuição do trabalho necessário?


Comentários: a luta de classes é contraditória. Com um aumento dos direitos sociais, há a possibilidade de que o excedente seja diminuído. Contudo, apesar dos direitos sociais romperem com a economia política, não há a completude do valor do trabalho.


Comentários: as garantias sociais acabam tendo um efeito inverso no sentido de beneficiar o trabalhador, pois possibilitam maior extração do mais-valor.


Comentários: Marx traz o salário na perspectiva geral, da massa salarial – olhar importante para pensar a Previdência (massa de contribuições que custeiam os benefícios).

A perspectiva da equivalência (dar a cada um o que necessita e exigir de acordo com que cada um consegue oferecer) não seria possível na lógica jurídica (com os pilares do sujeito de direito e das categorias jurídicas), mas poderia ser executada em uma sociedade comunista, por exemplo.


Comentários: o que compõe o fundo público é a tributação, que incide ou sobre trabalho necessário (isto é, sobretudo no consumo), ou sobre trabalho excedente (que é gerado pela classe trabalhadora). Isso porque a única fonte de geração de riqueza no capitalismo é o trabalho. Assim, as prestações sociais (alívio do fardo salarial, socialização dos custos) são custeadas pelo própria exploração do trabalho.


Comentários: o comentário da Júlia está ligado a questões de gênero, de propostas de questões domésticas suportadas pelo Estado, mas não de uma perspectiva coletiva. Questões de gênero não estão ligadas necessariamente à ruptura e ao bem-estar e gênero (desvinculadas da questão da reprodução da força de trabalho).


Comentários: a única pauta com relação a direitos de maternidade e reprodução da força de trabalho é a creche, que consiste no direito de retorno da mulher para a condição de exploração da força de trabalho. A institucionalização de bebês e crianças em idade precoce é uma das medidas do capitalismo para assegurar a reprodução da força de trabalho nos moldes necessários para a sua exploração – a creche incute os hábitos, a educação e a força para o condicionamento da força de trabalho. Isso traduz a qualidade da reprodução da força de trabalho, por exemplo, a diferença entre o tempo de licença de maternidade (a força de trabalho mais qualificada demanda mais tempo de reprodução).


Comentários: luta de creche para autogerência.


Comentários: a creche, tal como a escola, hábitos e tradições, está na teia de relações que são feitas por causa da troca. Possibilita a continuidade da força de trabalho e incute a mentalidade que se estendem a nossa vida privada – mesmo na esfera privada pensamos de acordo com a lógica da produção.


Comentários: apesar de passarmos por certos processos, não temos consciência desses, como a questão da creche.

O trabalho excedente é maior que o trabalho necessário.

A liberdade custa caro para nós (iniciação precoce no mercado de trabalho).


Comentários: a fala da Maria Luiza é um exemplo de como a ideologia tem base concreta e produz efeitos concretos – mesmo no momento de ócio temos a necessidade de produção.

A fala do Pablo nos revela que a liberdade de deixar a criança na creche está ligada à disposição da força de trabalho feminina para o mercado de trabalho (a ideia de liberdade está sempre conectada à disposição da força de trabalho).

As pautas de gênero têm que ser pensadas de forma conectada ao modo de produção capitalista. Caso contrário, nos contentamos com concessões do próprio sistema.


Comentários: o Estado, terceiro neutro, é central no debate da Previdência Social. A violência não pode ser direta, havendo a necessidade de um terceiro neutro. Houve uma mudança no conceito de neutralidade do Estado – esse continua sendo o terceiro garante das trocas, porém, o Estado deixa de ser reconhecido como um parceiro do Capital, de modo que a neutralidade (não política) mudou para eficácia e eficiência. Reformas do privado (como o trabalho por demanda) transportadas para o público – essas esferas estão mais próximas, pois quando a luta de classes arrefece, resta claro que ambas defendem a propriedade privada.


Comentários: com relação “Estado como “garante das trocas” [...]” (p. 74), o Estado mostra-se mais como um gestor de crises do capitalismo e um instrumento de perpetuação, do que um terceiro neutro.


Comentários: quando há conflitos, quem resolve é o Judiciário (recorre ao Estado), que deve ser imparcial – relação contraditória entre essência e aparência (na essência, o Estado tem mais comprometimento com o Capital, do que com o trabalhador). Contudo, ao mesmo tempo, há a ideia de reacomodação, as pessoas estão mais confortadas com um Estado gestor (elemento ideológico).


Comentários: a forma jurídica contempla melhor os conteúdos privados, enquanto que os conteúdos públicos buscam sua causa de legitimação no não jurídico. Nesse momento de dissenso da luta de classes e de ataque acentuado da burguesia, essa perspectiva de migração do público para o privado vem se apresentando de maneira muito forte, inclusive presente na estrutura do Estado – sai de terceiro neutro para se tornar um gestor, atuar dentro da eficácia e eficiência, que controle o gasto público (constitucionalização do controle da dívida pública por exemplo).

Movimentos dissonantes dos países centrais e periféricas – enquanto a aqui o Estado mostra-se como gestor (fortalecimento do âmbito privado como forma de gerência a crise social), nos países centrais há o renascimento de uma perspectiva pública (defesa de quebra de patente de vacina por Joe Biden como exemplo). Alguém tem que ser explorado para o sustento de uma possibilidade de Estado social nos países centrais.


Comentários: essa mudança da forma Estado (forma derivada) é decorrente de mudanças no capitalismo? Como essa alteração da perspectiva está ligada à mudança do capitalismo e de suas formas derivadas?


Comentários: conformação da forma – a forma é uma só, isto é, ela não é alterada pelo conteúdo, mas se compreende a forma entendendo o movimento do conteúdo. O conteúdo, por exemplo, ajuda a compreender a relação entre público e privado.

Estados Unidos e Europa (“viúvos” do Estado Social) entenderam que devem tomar cuidado com a luta de classes. A Europa ainda não está no mesmo processo que o Estados Unidos – a Alemanha, por exemplo, é um Estado Liberal com proveito da rede social que fez, mantém a competividade e um sistema integrado de previdência, assistência, saúde e desemprego, logo, houve a construção de um liberalismo social (é liberal, mas tem políticas sociais).


Comentários: observação das legislações atuais da Europa (equivalência é uma necessidade constante). O Estado Social Europeu não existiu de forma generalizada (apenas para os trabalhadores europeus).


Comentários: a conformação da forma irá produzir na essência ou na aparência? O movimento da forma vai operar na aparência do Estado, mas a forma política vai permanecer com a mesma estrutura?


Comentários: sim. A forma política é ditada pela dinâmica do Estado, do capitalismo. Determinação em última instância no modo de produção, que continua o mesmo, mas há uma mutabilidade da contradição entre essência e aparência – o capitalismo precisa se reinventar e ele se reinventa nas crises.

Sobre o Estado neutro, em greve de metroviários, o TRT/SP sempre determina pelo funcionamento constante.


Comentários: direito de ir e vir nas manifestações contra e pró Dilma.


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