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RELATÓRIO - Reunião 04/11/2021 - Para uma ontologia do ser social, Georg Lukács

Relatório – Reunião 04/1112021

Para uma ontologia do ser social


TEXTO: LUKÁCS, Georg. Prolegômenos e Para uma ontologia do ser social: obras de Georg Lukács. volume 13. Tradução Sérgio Lessa. Revisão Mariana Andrade. Maceió: Coletivo Veredas, 2018.


Breve apresentação (pp. 547-553):


“Criticamos, no lugar apropriado, o infeliz experimento de Hartmann com a solução »megárica« da relação entre possibilidade e realidade, acima de tudo porque com isso se perde a possibilidade como algo que não é nem real nem irreal, que em sua existência turva teve de ser completamente absorvida na realidade. A dialética das determinações de reflexão em Hegel pode apreender completamente diferente, inteiramente próxima ao real, essa relação.” (p. 547)


Hegel: «Essa realidade, que constitui a possibilidade de uma coisa, não é, por isso, a sua própria possibilidade, mas é o ser-em-si de um outro real; ela mesma é a realidade que deve ser superada, a possibilidade como apenas possibilidade«. (p. 547)


“Acreditamos que com isso está aberta a via para a compreensão da possibilidade no interior da realidade. [...] Que a função de possibilidade das propriedades, no ser social, se intensifica tanto extensiva quanto intensivamente, que com ela aparecem qualidades inteiramente novas, não requer nenhuma evidência detalhada.” (p. 548)

(o trecho supra é extraído do relatório do ANTERIOR)


- as determinações de reflexão estão no centro da dialética hegeliana, restando compreender a força desse centro que, segundo Lukacs, Hegel limita à essencial da sua lógica, “à parte do meio”.

Hegel: “Passar para Outro é o processo dialético na esfera do ser, e aparecer em Outro é (esse processo) na esfera da essência. Ao contrário, o movimento do conceito é desenvolvimento, pelo qual só é posto o que em si está presente.” (p. 548/9)


- Lukacs entende que a aludida classificação contraria a ontologia que vinha afirmando existir em Hegel, revelando-se insustentável ontologicamente. Reivindica o esclarecimento dialético de uma relação com base nas determinações da reflexão, realizado por Hegel ao investigar categorias da lógica do ser, antecipando o método e a estrutura das determinações de reflexão:


Hegel:


»Algo (...) está, portanto, em relação com o seu ser-outro; não é puramente o seu ser-outro. O ser-outro está contido nele e, ao mesmo tempo, ainda dele separado; ele é ser-para-outro.«


»Mas a verdade deles é a sua relação; o ser-para-outro e o ser-em-si são, por isso, aquelas determinações como momentos de um e mesmo posto, enquanto determinações cujas relações são e em sua unidade, na unidade da existência, permanecem. Cada um, com isso, contém em si ao mesmo tempo também o seu momento diferente de si.«


«Serem-si e ser-para-outro são, em um primeiro momento, diferentes; mas que o algo tenha o mesmo o que é em si nele e, inversamente, o que ele como ser-para-outro é, também é em si, — isto é a identidade do ser-em-si e ser-para-outro segundo a determinação de que o próprio algo é um e o mesmo ambos os momentos que nele são, portanto, inseparáveis.«


- Para Lukacs, o caráter reflexivo se impõe em cada estágio decisivo da investigação concreta. A relação do objeto ser-para-si e ser-para-outro é coordenada pela interação entre atração e repulsão. “A atração é operante na própria retração”.


- A relação de reflexão se mostra evidente na relação de qualidade com quantidade. Em Hegel, a metafísica idealista do sujeito-objeto idêntico resulta em falsas representações ligadas ao seu caráter ontológico que conduzem à aparência de que “enquanto qualidade e quantidade seriam formas de ser de objetos diferentemente dispostos, independentes entre si, que apenas em um determinado patamar chegam àquela relação recíproca que se costuma expressar como mudança de uma na outra”. Para Lukacs “a relação de medida é ontologicamente mais originária que os separados tipos de ser, obtidos pela abstração, de quantidade e qualidade (...) A determinabilidade quantitativa de qualquer objeto está em uma indissolúvel relação simultânea com um tipo de essência qualitativa”. (p.550)


- Qualidade e quantidade são, em sua essência ontológica, segundo típicas determinações de reflexão. (...) O nível de separação racional das determinações de reflexão não apenas é um estágio anterior à sua unificação dialética pela razão, mas também é um progresso civilizatório ante a percepção originária unitário-imediata (p. 551/2).


- Objeção de princípio à terceira parte da Lógica, a lógica do conceito, de Hegel.


Hegel: «O movimento do conceito, de certo modo, pode-se considerar como se fosse um jogo apenas; o Outro, que por ele é posto, do fato não é um Outro.« (p. 552)


Consequência lógica da teoria ontológica do sujeito-objeto idêntico, pois a logica do conceito representa o patamar mais elevado na conversão da substância em sujeito, o que corresponde


Hegel: »o conceito permanece junto a si mesmo em seu processo, pelo qual nada é posto de novo segundo o conteúdo, mas apenas se põe em evidência uma mudança de forma.«


- Lukacs: o desenvolvimento lança ininterruptamente problemas qualitativamente novos e introduz na realidade novos contrastes e contradições desconhecidas em um patamar inferior, e que não podem ser compreendidos como mera mudança de forma.

- Hegel rejeita a teoria da evolução para os seres vivos, mas a esfera do ser social, na sua concepção, é um componente do nível mais elevado da lógica. (p. 553)

- Se se contrapõe a estrutura da logica do conceito à estrutura descrita no processo de vida da natureza como um todo, demonstra-se que a compreensão dialética dos complexos e conexões, para além da metafísica, “retorna às autenticamente dialéticas determinações de reflexão”.

- Lukacs enfatiza três momentos:

i) processo de interação cujos componentes são, ao mesmo tempo, idênticos e contraditórios. Toda relação se revela típica precisamente para a determinação da reflexão;

ii) nessa inter-relação surge o novo, pleno de contradições, o que é incompatível com a visão harmônica do desenvolvimento;

iii) em oposição à teoria geral da interação, descobre o momento predominante, aproximando sua exposição das determinações da reflexão.

Na lógica do conceito emergem três categorias novas e específicas, que em sua específica peculiaridade, pode ontologicamente caracterizar determinadas estruturas e mudanças estruturais na sociedade:

i) generalidade;

ii) particularidade;

iii) singularidade.

“Essas três totalidades são, por isso, uma e mesma reflexão. «a Precisamente no mesmo espírito estas categorias são investigadas na lógica do conceito; a singularidade aparece como »já posta pela particularidade«, a qual, novamente, não é mais do que »a generalidade determinada«. »A generalidade e a particularidade aparecem (...) como os momentos do devir da singularidade.« »O particular, pela mesma razão, porque é apenas o geral determinado, também é singular e, ao inverso, porque o singular é o

geral determinado, é também um particular.« (p. 554)


Relatoria da leitura e debate:


COMENTÁRIO: Megárica: “Que diz respeito a uma escola fundada em Mégara por Euclides, a qual duvidava do testemunho dos sentidos, admitia a unidade absoluta e considerava o ser e o bem como idênticos. Próprio de incrédulo.” Uma escola que duvidava dos sentidos, na tentativa de racionalizar os processos.


COMENTÁRIO: O parágrafo remete ao que estávamos lendo na última semana, a possibilidade como algo pertencente à realidade. Na passagem da página (final da página 547/548), o texto remete ao capital, quando Marx trata do processo de troca: “a coisa manifesta a propriedade sob a condição de haver uma propriedade correspondente na outra coisa mas que ao mesmo tempo é peculiar” As pessoas só trocam algo, porque querem algo diferente mas, para trocar, é necessário que os elementos de troca tenham algo igual.


COMENTÁRIO: Refere um paralelo entre megárica e fetichismo. A ideia de Euclides era que os sentidos não servem para captar a verdade. Os sentidos só vão até a aparência, então é necessário atravessar a aparência, o que guarda relação com o fetichismo, no Marx. O sentido para na aparência. É necessário atravessar a aparência. A ideia de megárica era que o sentido para na aparência. Então é necessário atravessar a aparência.


Flávio: Hegel, na Fenomenologia do espírito e na Introdução à ciência da lógica despreza a matemática e a geometria como possibilidades de conhecimento da realidade. Hegel afirma que o conhecimento matemático é formal, não ultrapassa os limites para conhecimento da coisa em si. Por que Lukacs afirma que “Esta forma ontológica da possibilidade é precisamente separada daquelas formas específicas de reflexos homogeneizantes da realidade a partir da quantidade que, enquanto possibilidades intelectuais, no caso de não contradizerem a si próprias, são capazes de prestar um serviço ao esclarecimento da realidade: assim a matemática e a geometria.” (p. 548)?


COMENTÁRIO: Hegel dizia que é um conhecimento formal, portanto não ultrapassava os limites do entendimento para chegar ao verdadeiro conhecimento, à coisa em si.


COMENTÁRIO: Lukacs está criticando Hegel. Está ligando isso à questão da possibilidade: a matemática e a geometria talvez não desprezem as possibilidades.


COMENTÁRIO: “Opinamos que a diferença formulada como decisiva entre a lógica do se e lógica da essência, a saber, »passar para outro« e »aparecer em outro«, é insustentável ontologicamente.” (p. 549): Para Lukacs, a aparência faz parte da realidade. Critica Hegel quando flerta com o entendimento que não, no ser e essência.


COMENTÁRIO: O aparecer em outro seria a parte da representação. O ser é passar para o outro e a essência é aparecer em outro. As duas coisas são ontologicamente importantes. Aparecer em outro é a representação. Ser é passar e essência é aparecer. Ser e essência aparecem destacados e em processos de ser-passar / essência-aparecer. Também está presente no parágrafo precedente (final p. 548).


COMENTÁRIO: Pequena lógica é um “apelido” que se dá para a parte da Enciclopédia das ciências filosóficas em compendio, para diferenciar da Ciência da lógica. Não são coincidentes.


COMENTÁRIO: (p. 550) Diferença entre lógica do ser e lógica da essência é uma crítica fundamental, que traz dois elementos: 1. Determinações da reflexão são só da lógica da essência, e não logica do ser; 2. A crítica é que Lukacs consegue justamente enxergar as determinações na lógica do ser, ao contrário do Hegel.


COMENTÁRIO: O livro 1 da Ciência da lógica é a Doutrina do ser, e o 2 é Doutrina da essência. Aparentemente são referências a dois momentos da lógica.


COMENTÁRIO: As relações entre os elementos dentro da lógica da essência e da lógica do ser aparecem de modo diferente no Hegel, mas há pontos em comum: como surge o outro dentro da lógica. A questão é: como algo se torna outro? Nunca há plenamente algo, porque algo está sempre ligado com outro, por isso atração/repulsão. Nunca há plenamente outro. No Hegel isso não aparece dessa maneira. Hegel distingue a lógica do ser e a lógica da essência, mas o Lukacs parte do entendimento do Hegel para demonstrar que não é tão simples. Tudo é um ser para o outro, porque tudo está em relação. Vale para a lógica do ser e para a lógica da essência. A perspectiva remete à relação qualidade-quantidade. Quais são as transformações quantitativas e qualitativas das coisas? O debate vem na sequência da discussão de possibilidade. Eu não posso ver nada como outro que não seja antes possibilidade naquilo que era algo. Se eu não vejo possibilidade daquilo em algo, eu não posso ver aquilo como outro.


COMENTÁRIO: Se alguma coisa é sempre o mesmo ela não se transforma nunca. Para se transformar, o outro já deve estar na coisa. A questão é: por que para o Hegel é só na essência e, no Lukacs, é no ser também, e não só na essência?


COMENTÁRIO: (p. 551) Alguma coisa só pode existir numa determinada extensão. Em algum momento a quantidade se transforma em realidade, como se fossem momentos separados. Não dá conta do fato de que não existe nenhuma qualidade que não esteja em determinada quantidade, portanto, são inseparáveis.


COMENTÁRIO: (p. 552) Parece retomar o aspecto da matemática. Não são necessários os números. A percepção da existência quantitativa é suficiente. A quantidade não é um papel necessariamente matemático.


COMENTÁRIO: Como se a matemática fizesse uma abstração científica que falsifica, porque para a matemática nada importa além do número e sua lógica. É importante olhar para a história da filosofia sob essa perspectiva. Tirando Heráclito, até se conformar a tradição que se consolidou na modernidade, os filósofos, mesmo com suas diferenças, estavam justamente tentando superar a dimensão da quantidade para entender a qualidade das coisas. Lukacs mostra que no Hegel isso (dimensão da quantidade) é superado, mas fica um resquício que compromete a dialética. Pitágoras, Arquimedes faziam uma leitura matemática, mas não é a matemática no sentido que nós entendemos, porque era a busca da essência do ser. Não central não eram os números, mesmo com a matemática.


COMENTÁRIO: Vai no sentido do Hegel pela matemática.


COMENTÁRIO: Mas não explica o desprezo do Lukacs, pelo desprezo do Hegel.


COMENTÁRIO: Que matemática é essa (que não traz a qualidade na quantidade)? Na perspectiva do Hegel, era a perspectiva do Descartes. Aquele método matemático que pautava uma visão, uma observação mecânica do mundo.


COMENTÁRIO: Matemática como método. A forma, a geometria como método. Era a matemática no sentido de realizar o pensamento.


COMENTÁRIO: A briga que o Hegel compra é gigantesca, porque era um grupo de filósofos que, apoiados no método matemático, afirmavam que o que não era aquilo, era falso. O modelo, até então, era o modelo da matemático.


COMENTÁRIO: A matemática muda na filosofia. Os pré-socráticos, mesmo quando explicam a realidade por elementos químicos ou matemáticos, explicam de outra maneira. Explicam no pensamento da essência do ser, não como um elemento formal de lógica de pensamento.


COMENTÁRIO: Retomar a Carta ao pai em Tréveris, de Karl Marx, escrita em 10 de novembro de 1837 (Disponível em: https://www.marxists.org/portugues/marx/1837/11/10.htm). Marx fala que o triângulo deixa que o matemático o construa e o demonstre como uma pura representação no interior do espaço sem chegar a desenvolver-se sobre outras formas para que adquira outras posições a que relacioná-lo com outras coisas. O Marx de 1837 também está preocupado com a discussão relacional, o processo que dialoga com o debate de quantidade e qualidade, retomado por Lukacs para destacar a processualidade das coisas. A questão tem relação com a discussão das transformações ocorridas na matemática. Como pensar não de forma fragmentada para perceber que quantidade e qualidade estão relacionadas? Alexandre Cheptulin discute a questão da qualidade como um conjunto de propriedades indicativas da coisa, aquilo precisamente que é a coisa e a quantidade, revelando o universo de propriedades das coisas que esta coisa exprime. Quantidade e qualidade são duas categorias centrais da dialética, que não podem ser pensadas de forma apartada. Há uma autonomia, uma especificidade das categorias, mas uma autodeterminação necessária entre elas. O debate da transformação da matemática no destacamento dos aspectos meramente quantitativos é tão importante que tem repercussão na revolução marginalista, a mudança da economia política para economia, e da economia para econometria. A revolução marginalista abandona o aspecto histórico e processual, impondo a primazia dos números.


COMENTÁRIO: Tem relação com o que o Lukacs falava antes, no texto, sobre gnosiologia e ontologia, e a recusa da gnosiologia atribuída ao Hegel. Lukacs fala da abstração generalizante (2+2=4, mas 2 bananas + 2 bananas= 4bananas, 2 bananas + 2 laranjas = salada de fruta). A matemática restringe seu conhecimento ao aspecto formal. Para na gnosiologia, sem conseguir fazer afirmações sobre o ser na realidade. As fórmulas matemáticas não dizem nada, sem referência na realidade


COMENTÁRIO: Existe uma tendência também na ciência política em “matematizar”. Existem estudos quantitativos no Direito (jurimetria), em que há gráficos sobre a constitucionalização de um país. Esse é o limite caricatural da coisa. É necessário retomar para o aspecto filosófico. Descartes fala que o livro do mundo é escrito em caracteres matemáticos. No período, as ciências naturais estão dando saltos, revoluções, e a matemática tem um papel indispensável nas ciências naturais. Até Marx expressa as relações n’O capital por elementos matemáticos, numa tentativa de “encurtar”, simplificar a análise e o conceito. Essa crítica ao que vai dar no positivismo, que é o formalismo, está correta, mas concordo com Lukacs, no sentido de que a crítica filosófica a essa tendência formalizante do iluminismo, que vai dar no positivismo, não autoriza o desprezo do papel da matemática em toda a ciência. Destaca a crítica do Hegel, de que toda a qualidade existe numa determinada quantidade. Dentro de cada coisa que não é um, existe um conflito interno e por isso se torna outra coisa. Uma quantidade de certa coisa em relação com uma quantidade de outra coisa. Mudanças externas podem fazer com que essa quantidade se altere e por isso a coisa se transforma em outra coisa.


COMENTÁRIO: Pensando no processo histórico sobre a passagem de quantidade em qualidade. Parece que a passagem do trabalho concreto ao abstrato é uma passagem quantitativa e qualitativa. No trabalho concreto, pegando o exemplo do rebanho, o pastor pode não saber contar, mas seu contato é tamanho que ele consegue controlar o rebanho. Disso se passa para a equivalência. É uma mudança quantitativa e qualitativa, onde se contam as ovelhas para fazer a troca, etc.


COMENTÁRIO: O traço distintivo entre Hegel, Marx e Lukacs: para Hegel, a matemática é estritamente quantitativa. Marx supera isso, e o exemplo do trabalho abstrato é interessante para demonstrar a processualidade da quantidade e qualidade.


COMENTÁRIO: A matemática, em Pitágoras, era uma tentativa de achar um verbo divino. Os pitagóricos acreditavam que havia um discurso, uma verdade, um logus matemático. A diferença da matemática na antiguidade e na modernidade, é o que Lukacs chama de diferença entre ontologia e gnosiologia. Os modernos deixam de procurar a relação essencial da matemática e do ser. Deixam de responder por que a ovelha é uma ovelha, o que a torna ovelha, e passam a contam 1, 2, 3 ovelhas. As coisas passam a ser fungíveis. A matemática muda de abordagem nesse sentido, e passa a ser meramente manipulativa. Algo que os positivistas estão fazendo. Na antiguidade, com a matemática querem entender não apenas o ser, mas o dever ser do mundo.


COMENTÁRIO: Esse ponto ajuda a compreender. A diferença entre a matemática que era a busca da essência, e passa a ser uma forma, uma representação. Ajuda a entender a distinção entre ser-essência, ser no outro, ser em si.


COMENTÁRIO: Na tradição filosófica moderna, discutimos ser e essência. Na tradição pré-moderna, fala-se em essência e existência, e a existência comportava distintas qualidades. Essência é a qualidade mais elevada, mais digna da existência, as coisas que não são acidentais, mas essenciais. Tem relação com a questão do logus matemático. A matemática é uma linguagem e, sendo uma linguagem, propormos suas regras. 2+2=4 porque determinamos, de saída, que seja assim. O mundo não é recepcionável pela lógica matemática de maneira estrita. Não é porque o sol sempre se levantou, que conseguimos demonstrar matematicamente que amanhã ele vai se levantar outra vez. Uma lógica é a da linguagem, e a outra é de um encontro das coisas, em que a gente tem que sair da nossa perspectiva. Essa busca da matemática quanto logus denuncia um idealismo. A questão da essência e existência ou do ser e da essência, é a busca da pedra filosofal. A filosofia tenta o tempo todo achar uma maneira de ter “regras de dominar o mundo”. A relação com a diferença vai trazer a relação da luta de classes, a relação da política que é irredutível a um logus, a uma previsibilidade, uma regra matemática, um controle. O próprio Lukacs fala do Weber, sobre o capitalismo como uma maneira de obter o controle do mundo. Nesse sentido, a filosofia, buscando controlar o incontrolável, se coloca como um véu ideológico. Tenta contornar a imprevisibilidade, a diferença. Atua como véu acerca das questões de violência. A diferença entre essência e existência: tudo existe, mas existem maneiras de existir que não são dignas. Busca-se a maneira verdadeira, no sentido ontológico. Busca-se a existência não na maneira como ela é, mas como deveria ser.


COMENTÁRIO: O Leal destaca a matemática como linguagem. No trabalho com Avelãs Nunes, da Universidade de Lisboa, trazemos a questão da economia matemática. Essa matematização do conhecimento abarca diversas áreas do conhecimento, mas demos destaque à economia política. Existem aqueles que consideram a economia matemática como um ramo da matemática aplicada. John Richard Hicks afirma que a matemática não é uma ciência. É uma lógica, pelo que a utilização da matemática como um instrumento analítico não significa que a economia matemática deva ser considerada uma ciência. O próprio Alfred Marshall, num livro de 1881, ainda que represente uma perspectiva analítica oposta à nossa, destaca a preocupação de que a matemática o faça perder de vista os fatos econômicos reais. Existe uma discussão moderna contemporânea importante: a matemática como disciplina que passa a retirar o papel da política e da história, do debate intelectual. Russel afirma que com isto deixamos de saber se aquilo que estamos a falar é verdadeiro. A primazia da matemática nos coloca esse caráter de algo formal, que ignora a história e a política, levando a ciência a uma clausura. O texto foi publicado na Revista Vértice, em Portugal, onde é feito um debate sobre a revolução marginalista e como os economistas se valem da matemática e seus conceitos abstratos, não analisando fenômenos, com proposições logicamente verdadeiras, que precisam de confirmação na realidade. A revolução marginalista emerge em um processo de contraposição ao marxismo.


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