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RELATÓRIO - Reunião 23/11/2022 - Para uma ontologia do ser social, Georg Lukács (p. 501 a 555)

Relatório – Reunião 23/11/2022

Para uma ontologia do ser social (p. 501 a 555)


TEXTO: LUKÁCS, Georg. Prolegômenos e Para uma ontologia do ser social: obras de Georg Lukács. volume 13. Tradução Sérgio Lessa. Revisão Mariana Andrade. Maceió: Coletivo Veredas, 2018.



  • O autor considera a alienação como como um “fenômeno exclusivamente histórico-social” que surge em um nível de desenvolvimento e toma formas historicamente diferentes. Não tem haver com uma condição humana ou com uma “generalidade cósmica”.

  • Hegel ao tratar da alienação na Fenomenologia tem uma interpretação generalizada com raízes lógico-especulativas, sendo que, para ele, as alienações seriam “meras alienações do puro pensamento filosófico”. – “Toda a história da exteriorização e toda revogação da exteriorização não é, por isso, mais do que a história da produção do pensar abstrato, absoluto, do pensar lógico especulativo”. A questão central do surgimento e superação da alienação estaria então na “superação da objetividade em geral na autoconsciência que, enquanto processo, conduz ao pôr do sujeito-objeto idêntico” – “A questão principal é que o objeto da consciência não é mais do que a autoconsciência, ou que o objeto é apenas a autoconsciência objetificada, a autoconsciência como objeto. [...] A objetividade como tal passa por uma relação alienada do homem, uma relação do homem que não corresponde à essência humana, à autoconsciência”.

Descolamento da materialidade.

  • Marx polemiza contra esta concepção a partir de uma crítica ontológica-materialisticamente em que argumento que a objetividade não é produto do pensamento do homem e sim algo ontologicamente primário, ou seja, é originário e não pode ser separada do ser. Nas palavras de Marx: “que o homem é um ser objetivo sensível, real, vivo, de força natural, corpóreo, significa que ele... só pode exteriorizar a sua vida em objetos sensíveis reais. Ser objetivo, natural, sensível e do mesmo modo ter objeto, natureza, sentido fora de si ou ser propriedade objeto, natureza, sentido para um terceiro ser, é idêntico”. É a partir dessa base do pensamento marxiano e comentários feitos pelo jovem e velho Marx que se pode analisar adequadamente a “alienação real como processo do ser real no ser social real dos seres humanos” – determinando o lugar ontológico da alienação no processo de desenvolvimento social.

Autoconsciência não produz objetividade (contra Hegel). E que essa construção de objetividade é social. Fenômeno histórico-social e não se dá na consciência, mas no processo de criar e exteriorizar objetos.

  • No desenvolvimento das forças produtivas há a formação superior das capacidades humanas e há possibilidade de durante este processo ocorrer o sacrifício de indivíduos (mesmo classes inteiras). Para o autor, esta contradição é importante porque demonstra os momentos ontológicos do processo social do trabalho, como já exposto em outros momentos. O processo de produção é síntese de posições teleológicas. “As posições teleológicas singulares constituem o ponto de partida para cadeias causais singulares que se sumarizam no processo como um todo; nele recebem também novas funções e significados, que, contudo, jamais podem perder seu caráter causal”. Neste processo há heterogeneidades nos grupos de posição, o que Marx chama de desigualdade do desenvolvimento, o que não faz com que o caráter causal do todo e suas partes seja superado, pelo contrário, é ainda mais enfatizado.

De novo o automatismo do desenvolvimento das forças produtivas, como se fossem o “sentido da humanidade”, ideia de progresso; primado das forças produtivas muito enfatizado; elemento causal é como se fosse inexorável ao destino da humanidade o desenvolvimento das forças produtivas que desenvolve a humanidade como um todo. Discurso do progresso ocidental: marcha do progresso que “infelizmente” haverá corpos que vão tombar. Desenvolvimento das forças produtivas como “capacidades humanas” refere a essa generalidade, genérico, sem determinação histórico e social. E descolando que não está imbricado e é materialização de determinadas relações sociais de produção e exploração capitalistas que são históricas e específicas (não genéricas e “humanas”). Não aparece a contradição nesse processo, o “outro lado” desse processo. E da “outra classe” que pode destruir esse desenvolvimento. Retira a classe e a luta de classes e contradição. Sem visão dialética do processo histórico. Primado do desenvolvimento das forças produtivas parece ser estruturante e é um primado, inclusive, causal. No encontro passado falamos da ciência e Lukács parece falar da causalidade como algo técnico e mecânico. Se estamos falando desse desenvolvimento como “potência humana” que se exterioriza e se materializa nos objetos, quando se fala de alienação: a alienação não seria histórica? Vai ter alienação no socialismo?

  • Para entrar no problema da alienação – “o desenvolvimento das capacidades humanas deve, não necessariamente, leva a um desenvolvimento da personalidade humana. Ao contrário: precisamente por esse desdobramento ascendente das capacidades singulares ele pode distorcer, degradar a personalidade humana”. As alienações recebem formas e conteúdos diferentes nos distintos patamares de desenvolvimento – “a oposição fundamental entre o desenvolvimento da capacidade e desdobramento da personalidade está na base dos seus diferentes modos fenomênicos”.

  • Lukács retoma a duplicidade do ato do trabalho (já exposta anteriormente) – objetificação e exteriorização (dois aspectos do mesmo processo). A partir disso, expõe que o desenvolvimento das capacidades humanas sobre o desenvolvimento das personalidades humanas é “uma tendencia social geral objetivamente existente e que tem efeito objetivo. Esta parece acarretar, do mesmo modo, uma média social que, todavia, se distingue qualitativamente daquele que surge das objetificações”. Esta média real trata apenas do cumprimento das tarefas concretas, mas na sua exteriorização “podem surgir modos de comportamentos absolutamente opostos”.

Ideologia jurídica: sujeito proprietário de seu objeto (objetivação do trabalho que se exterioriza e se aliena do sujeito) livre para dispor dele e que “no cumprimento das tarefas concretas”, ante essa exteriorização, leva a comportamentos diversos (liberdade e autonomia do sujeito de dispor de sua propriedade como quiser!

  • “Toda a história a partir de uma determinada altura da divisão de trabalho (provavelmente já desde a escravidão) é também a da alienação humana”. De modo que também há uma continuidade histórica na alienação > não tem determinação histórica!!!

  • Há uma indissociabilidade entre social com o pessoal, por isso a importância de considerar essas questões em sua complexidade concreta. “A contradição dialética entre o desenvolvimento da capacidade e o desenvolvimento da personalidade, portanto a alienação, por toda a sua importância, jamais abarca a completa totalidade do ser social dos seres humanos; por outro lado, jamais se deixa (quando muito em desfiguração subjetivista) ser reduzida a uma contraposição abstrata de subjetividade e objetividade, a uma contraposição de ser humano singular e sociedade, de individualidade e sociedade”. Todas as subjetividades têm raízes e determinações sociais.

  • Não basta apenas olhar para a contradição entre o desenvolvimento da capacidade e desenvolvimento da personalidade. Até porque muitas vezes o segundo depende da formação mais elevada das capacidades singulares. A divisão social do trabalho é um importante momento da sua gênese. A simultaneidade de tarefas heterogêneas tem uma tendencia unificadora pelo simples fato do ser humano ser unitário – inevitabilidade ontológica. “Uma consideração unilateralmente diferenciadora pode tentar acomodar seus atos práticos singulares em rubricas completamente diversas e independentes entre si, elas constituem para sua vida pessoal uma unidade indecomponível, nela estão em indissolúveis interações mútuas; têm, mesmo imediatamente se postas isoladamente em um movimento, em sua execução e nas suas consequências, em seus efeitos de retorno sobre o próprio ser humano, uma influencia inexoravelmente unificadora”.

De forma bem solta traz conceito de alienação: contradição dialética entre o desenvolvimento da capacidade e personalidade. “capacidade” são as habilidades que a divisão social do trabalho é capaz de engendrar? Ligado ao desenvolvimento das forças produtivas? E a personalidade mais a subjetividade jurídica? Se for isso é o indivíduo construído pelo trabalho. Trabalho social que molda o homem de forma totalmente a-histórica. Fazer humano, que nesse fazer produz o homem – filosofia burguesa. Sociedade desenvolve o homem e homem desenvolve a sociedade. Subjetividade é fruto do trabalho (não adjetivado). Capacidade é fruto do desenvolvimento das forças produtivas e personalidade o constituir-se como sujeito/indivíduo no “todo” social. Desagua numa valorização positiva da divisão social do trabalho que tem como objetivo promover a valorização do valor. Sem determinação, mas próprio do “gênero humano”. Valorização do valor como “desenvolvimento da humanidade”.

  • Com a crescente divisão social do trabalho e para responder os problemas colocados para o ser humano singular responder – “a mera singularidade dos seres humanos singulares move-se sempre mais na direção do desenvolvimento da personalidade”. As relações socio dinâmicas se transformam em necessidades econômicas, geral-sociais e os processos da vida se tornam mais individuais.

  • Para compreender o fenômeno da alienação é necessário considerar que a personalidade é uma categoria social. É logico que o ser humano é ser vivo, como todos os produtos da natureza organiza. “Todavia, o afastamento – afastamento inexorável, mas jamais desaparecido – da barreira natural é um traço essencial não apenas de todo o processo de reprodução da sociedade, mas inseparável também da vida individual”. Será que o que ele tá chamando de “personalidade” é o que a gente chama de “subjetividade”? Parece que sim, conforme depreendido do trecho anterior (comentários anteriores). Personalidade e individualidade são coisas diferentes. Personalidade é categoria social (o que nós chamaríamos de subjetividade jurídica).

  • O desenvolvimento das forças produtivas do trabalho e a diminuição do tempo necessário para a reprodução do ser humano – e não do capital! As forças produtivas vão substituir o trabalho; o ser humano cada vez menos tem que trabalhar pra garantir suas necessidades básicas. Mas as forças produtivas do capital justamente se desenvolvem pra ampliar a extração de mais valia e não pra nos liberar das necessidades imediatas e permitir “desenvolver nossas capacidades humanas. “tem por consequência, através da mediação do espaço de manobra do consumo economicamente a cada vez possibilitado, que o peso econômico dos atos necessários para a reprodução imediata da vida física perde, sempre mais, seu inicial papel absolutamente dominante, que emergem necessidades e possibilidades para sua satisfação que ocupam uma posição sempre mais distante da reprodução imediata da mera vida”. O autor caracteriza este processo como sendo ao memo tempo, extensivo e intensivo, qualitativo e quantitativo. As necessidades se modificam com o desenvolvimento social e se elevam a outros níveis que são afastadas dessa reprodução imediata da vida, a exemplo da própria alimentação.

Existência material cede lugar pras capacidades humanas. Abre espaço pros debates contemporâneas da cultural, linguagem, etc. Mas ainda é sobre comer todos os dias! Forças produtivas do trabalho (de modo genérico) e não do capital! Sem determinação histórica! Cada vez mais se afasta de Marx! Cap. 14 do capital mostra como, na verdade, o capitalismo aumentou o tempo de trabalho. Talvez seja pelo contexto histórico dele do pós-guerra de achar q é assim que a humanidade ia se desenvolver.

  • Na antiguidade já há uma determinação importante no processo de alienação e da luta contra ela: “a consciência de ser-humano como generidade para si já aparece em modo socialmente ineliminável: o ser humano alienado deve, mesmo na alienação, preservar sua generidade em si: senhor de escravo e escravo, marido e esposa, no sentido da Antiguidade, são já categorias sociais, elevam-se, mesmo no mais extremo tornar-se alienado, acima do mero ser natural do devir-humano inicial. (Este sequer poderia conhecer alienações de tipo social).”. O que é tirado do ser humano alienado não é apenas o seu ser-humano social, mas também o pertencimento à socialidade do gênero humano. “Quando é falado, portanto, de generidade para si, de seu tornar-se efetiva ou ausência, deve ser considerada uma consciência qualitativamente outra, de espécie superior. Trata-se aqui da diferença já exposta, do ser humano particular para com aquele que é capaz de elevar conscientemente para além da sua própria particularidade”.

  • Lukács defende que se deve tomar cuidado com fetichizações idealistas, por isso sua gênese social, sua qualidade ontológica, deve ser criticamente investigada. Desde o surgimento das representações, a mais importante é a “separação coisificadora que se elevou para além da particularidade do ser humano inteiro normal como um todo existente social-fisicamente”. Essa visão culmina no cristianismo e teve uma grande influencia na imagem ontológica do ser humano.

  • Não há alienação antropológica geral ou supra histórica, a alienação tem caráter histórico-social e é diferente em cada formação, em cada período a partir das forças sociais aí operantes. Tal afirmação não contradiz a continuidade histórica, uma vez que uma situação alienada pode ser superada por uma nova forma de alienação.

Aqui há algumas respostas a perguntas que nos colocamos. Esse último parágrafo parece a confirmação do que colocamos. Embora tente colocar alienação de forma histórica, ele coloca a alienação como uma forma a-histórica que muda o conteúdo. É só substituirmos pelo direito “não há direito supra-histórico, mas um direito pode ser superado por uma nova forma de jurisdição”. Alienação é uma forma social que acompanha o desenvolvimento da humanidade, cujo conteúdo é modificado conforme muda o ser social. Não seria possível superar a alienação, apenas uma forma de alienação ser substituída por outra. Uma historicidade igual o historicismo do direito.

Alienação é decorrente do trabalho a-histórico e genérico (exteriorização do sujeito no objeto) que seguiria existindo em todas as formações sociais. Inclusive no comunismo.

Devir humano parece muito relacionado a “paz social”, pulsão de unificação da humanidade, que desconsidera por completo a divisão de classe. Conclama a generalidade humana existente em cada modo de produção.

  • O fenômeno da alienação no singular representa apenas um conceito teórico puramente abstrato, é um fenômeno real do ser social, que só pode ser encontrado na forma da pluralidade. “O modo pluralista de ser das alienações significa, todavia, muito além disso, complexos dinâmicos de alienação qualitativamente diferentes entre si e suas tentativas de ultrapassagem conscientes, subjetivas”.

  • A partir das considerações sobre alienação, Lukács aborda a relação do homem mulher. Uma relação que tem condições socialmente determinadas. “Ainda que a direção básica do desenvolvimento social crie formas alienadas e estreitas para essa relação, essas mesmas tendencias de desenvolvimento encontram vias espontâneas para de algum modo satisfazer necessidades de ordem superior”. O desenvolvimento econômico no nível da generidade produziu progressos como a independência econômica das mulheres ou mesmo o combate a falsa ideia de inferioridade feminina. No entanto, os movimentos sexuais seguem lutando pela libertação da alienação da mulher na relação com o homem. Estes mesmos movimentos afirmam que a independência econômica pouco contribuiu para a igualdade de fato da mulher no trabalho e vida familiar. “A igualdade deve, portanto, ser conquistada antes de tudo no próprio solo de seu confisco, o da sexualidade”. Para o autor, “a luta de libertação da mulher ante de sua alienação não é dirigida, ontologicamente, meramente contra esforços de alienação que partem dos homens, mas deve também intencionar a uma própria autolibertação interior”.

  • “O ser humano permanece, por mais amplo o afastamento das barreiras naturais de modo inexorável uma espécie de ser natural, e o confisco, a atrofia de sua existência natural deve, por isso, desfigurar sua vida como um todo”. Destaca-se que esse afastamento da barreira natural, constitui a base de sua existência como ser humano. Assim, para o autor, uma libertação sexual isolada não irá resolver toda a questão do tornar-se-humano das relações entre os sexos. “Apenas quando os seres humanos encontrarem relações mútuas que de modo inseparável os unam como seres naturais (tornados sociais) e, ao mesmo tempo, como personalidades humanas, pode a alienação na vida sexual ser realmente ultrapassada”.

Direito! Direito das mulheres por igualdade jurídica. Seres humanos são iguais. Busca por direito, reconhecimento como sujeitos jurídicos iguais. Ideia da equivalência. Generalidade humana é a igualdade jurídica. Personalidade é subjetividade jurídica. Máscara da sociabilidade burguesa. Esfera econômica privada (desenvolvimento das forças produtivas, divisão social do trabalho e “capacidades”) e esfera política pública (personalidade, capacidade jurídica). Libertação feminina não é na esfera econômica, mas pra ser reconhecida como personalidade jurídica. Alienação feminina é a mulher tornar-se objeto do homem. Mantem-se nos marcos sujeito-objeto. E implicaria em mulher ser “criação” objetivada do sujeito homem. E a luta é pela generalidade humana. Se a mulher é objeto é exteriorização dos homens criadas por eles. E a forma de superação é o reconhecimento como ser humano como um todo. Tudo soa bastante hegeliano. Antes falava em pluralidade de alienações, como “forma”, o que é curioso. E faz isso ao longo dos parágrafos, com demarcações severas: “formas históricas sempre diferentes e incisivas”. Mas aí ele volta no trecho destacado que parece se contradizer: “não há alienação supra-histórica”. Problema recorrente ao longo do texto, de demarcar algo e depois demarcar outro que parece se contradizer. Pluralidade de alienações e “sub-espécie” de alienações que é a sexual e fala de “auto-liberação” interior que é algo bastante hegeliano. Retoma o problema da alienação do trabalho, que precisa se encontrar como exteriorização do sujeito mas a solução dessa passagem de em-si e para-si, interior, bastante hegeliana e ideal. Todo esforço de tentar evidenciar um traço de materialidade se esvai nesse hegelianismo. Saída da alienação é no campo ideal (de dentro precisa encontrar forma de negar essa alienação – um interior preservado da alienação que tem que se libertar).

  • A partir da esfera da arte, Lukács uma característica importante do desenvolvimento social: “a expansão social espontânea da generidade em si costuma, de fato, para muitíssimos seres humanos, na maioria das vezes, interromper-se no nível da particularidade, mas que ela, também espontaneamente sempre produz espaços de manobra de possibilidade para a generidade para si”. Os exemplos utilizados pelo autor indicam que a “ultrapassagem da particularidade como possibilidade para todos os seres humanos nas mais diferentes esferas da vida é latente e permanentemente existente. A diferença desse tipo de práxis social e seu desenvolvimento ascendente da generidade em si puramente econômica é justamente que esta se impõe independentemente dos desejos e vontades dos seres humanos, enquanto naquela as intenções das posições teleológicas afetam imediata e decisivamente os resultados, mesmo se não são necessariamente acompanhadas por uma consciência correta”.

O em-si tem a “manobra de possibilidade” do para-si. Como possibilidade para todos os “seres humanos”. Em-si pode alcançar o para-si, e a consciência entra em cena. Identidade sujeito-objeto.

  • Para entender a alienação o central é a dialética real de objetivação e exteriorização (desenvolvimento das capacidades e da personalidade). “A unidade objetivamente indivisível de objetivação e exteriorização permanece, com isso, evidentemente, existente, ainda que em sua estrutura interna recorram importantes alterações. A mais importante delas é uma certa preponderância objetiva da exteriorização na objetivação executada da posição teleológica. Essa preponderância, contudo, não deve ser compreendida nem demasiado literalmente, nem demasiado diretamente.”

  • A alienação é apenas um dos fenômenos da socialização e não pode ser considerada como a única objetivação do processo social – tal caminho repetiria o erro de Hegel que traçou uma identificação geral de alienação e objetividade.

  • A análise das “formas de transição “entre as objetificações da generidade em si e para si, em sua conexão com a personalidade particular e nãos mais particular” aponta para dois movimentos. O primeiro, é que a preponderância da exteriorização em relação a objetivação não garante a mudança da generidade para si sobre a em si. “Uma vez surgidas as formas ideológicas para o dirimir de tais conflitos sociais, as posições teleológicas que aqui ocorrem podem levar tanto a objetivações das existentes generidade em si quanto a da generidade para si.” O segundo é um contramovimento ideológico. A dinâmica em que as formas ideológicas transpassam umas as outras como fundamentação, complementação entre outros, tem como consequência “que muitas formas de manifestação ideológicas que costumam, em condições normais, promover a formação, a consolidação etc da generidade em si podem desempenhas funções importantes, com frequência mesmo decisivas, no desenvolvimento do seu ser-para-si”.

  • Os mal-entendidos das ideologias tornam-se “eles, na prática, promotores da luta para o genérico ser para-si na história da humanidade.”. É necessário compreender que a imposição e disseminação dessa mudança teve o Direito como mediador. Para Lukáks o Direito é “um instrumento para fixar validamente o respectivo status quo econômico visando ao seu funcionamento sem atritos; não tem, portanto, nesse plano, nenhum, ser-dirigido ao para si da generidade existente dos seres humanos. [...] a intenção para o ser-para-si enquanto possibilidade está igualmente contida no Direito, e que essa, se for o caso, pode se expressas explosivamente”. Exemplo do caso Dreyfus. Há uma desigualdade nos órgãos ideológicos de resolução, que podem ter ascensão ou degradação, mas não conseguem superar a continuidade das ideologias.

Motor da história é o ideológico do alcançar o “para-si”; alcançar o ser “humano total”, generalidade absoluta. Não há luta de classes. “Espiral de consciência”, de elevação. Categoria de “verdade”, de absolutização da consciência. Quase um “nirvana” que eleva o ser humano à categoria de “super ser humano”. Uma coisa meio religiosa, até! De existir esse lugar de paz e plenitude. Dissolvendo classe, conflitos e lutas. Processo individual de desenvolvimento com possibilidade de alcançar plenitude e que todos os seres humanos alcançarem isso. Diferente do HCC aqui sequer aparece a possibilidade de isso acontecer com o conjunto da classe. Ele menciona que essa possibilidade está contida no Direito, nesse arranjo social de dirimir conflitos e guarda essa possibilidade de expressão da generalidade humana. E que pode se expressar explosivamente. Parece retomar a ideia de potencialidade emancipatória do Direito e do seu uso, embora com outra forma de arranjo. Há uma certa teoria do direito e uma função trans-histórica do direito e ele poder guardar a intenção do “ser-para-si”, e a possibilidade de uso explosivo disso. Isso se “encaixa” com o que falamos antes de a generalidade ser alcançar a subjetividade jurídica plena, então o ser-para-si estaria contido no direito e poderia se realizar.

  • “Decisivo permanece onde, quando e como de fato tem lugar uma ocorrência exemplar para a generidade para si, para o autêntico tornar-se-personalidade dos seres humanos, contra sua alienação”. Quanto mais desenvolvido está o aparato ideológico no capitalismo, mais irá reforçar a alienação nos seres humanos, “para o movimento revolucionário dos trabalhadores, para o despertar, promover o mais possível organizar o fator subjetivo, o desmascaramento da alienação como alienação, na luta consciente contra ela, constitui um importante momento (claro: apesar disso, apenas um momento) da preparação da revolução”.

Se nossa percepção de personalidade = personalidade estiver correta, ele está dizendo que a efetivação dos direitos humanos na sua totalidade e igualdade dos seres humanos é a luta contra a alienação. A subjetividade jurídica é o posto da alienação. Ele está dizendo que o adensamento da personalidade jurídica – tornar-se sujeito de direito pleno – é a forma de combate da alienação > defesa dos direitos. Movimento revolucionário vai se valer da personalidade e igualdade jurídica para fazer valer suas pautas. Recuperar a propriedade sobre aquilo que você produziu. Essas produções são suas, tornar-se proprietário daquilo que se exteriorizou e se alienou de você. Contra a alienação é a não cisão entre sujeito e objeto e sua identidade absoluta. Generalidade humana é tornar-se proprietário. Atualmente a ideologia jurídica nos interpela como capitalistas (“mini-capitalistas”: ideia do mérito, empreendedorismo). A ontologia do ser social parece como uma ontologia da propriedade privada. Realização do ser-para-si é realização plena da subjetividade jurídica, do sujeito proprietário.

  • A alienação, apesar de relevante, não é a única forma de opressão do ser humano. A alienação não é uma esfera especial da estrutura social ou uma condição humana apartada da luta de classes – primeira vez que aparece! “Ao contrário. Sem alterar algo na nossa posição fundamental, podemos dizer: não há nenhuma luta de classes em que o pró e o contra ante as então importantes formas de alienação não tenha um significado direto ou indireto, decisivo ou episódico”.

  • Lenin no livro “O que fazer?” analisa como tema central na luta de classes dos trabalhadores a oposição entre a espontaneidade e conscienciosidade. Sendo que esta oposição não é considerada de forma psicologicamente, mas sim conteudistico-socialmente: “a questão de quais momentos da exploração capitalista determina essencialmente o comportamento dos trabalhadores que se rebelam contra ela”. A espontaneidade é a reação imediata, já a conscienciosidade, para Lenin, “significa o apreender intelectual e, ao mesmo tempo, o combate pratico do sistema capitalista com a totalidade”. Desta forma, a conscienciosidade não surge de forma espontânea na classe trabalhadora “ela deve ser trazida de fora tornando-se com isso, contudo, um autoconhecimento da classe”.

  • O autor explica a ênfase dada ao “entrelaçamento social de acaso e determinabilidade geral” porque no fenômeno da alienação há preconceitos e desentendimentos. É frequente na ontologia da vida cotidiana as representações “da qualidade fatídica, invencível, da alienação”. As ideologias das classes dominantes tem as alienações como “dado da natureza”, no entanto, também há fetichizações no marxismo, sobretudo na Segunda Internacional, com uma visão mecanicista da alienação e suas bases econômicas. A partir desta concepção, sustenta-se que a transição para o socialismo em si já acabaria com o capitalismo e suas consequências ideológicas, ou seja, “a mera introdução do socialismo conduz ao fim da alienação”.

Interessante que a tarefa da revolução aparece como fim da alienação > reapropriação do objeto produzido pelo sujeito. Isso fica aquém de concepções do socialismo que colocam a revolução como destruição da propriedade privada e torna-la estatal (socialismo jurídico) sob comando da ditadura do proletariado. Se observarmos bem ele sequer menciona “propriedade privada” em nenhum momento. É fusão sujeito-objeto enquanto proprietário.

  • Para compreender a alienação é fundamental voltar para os escritos do próprio Marx, rapidamente tratados por Lukács. Em resumo: “primeiro, toda alienação é um fenômeno fundado social-economicamente; sem mudança decisiva na estrutura econômica nenhuma ação individual pode alterar algo essencial nessa base. Segundo, toda alienação, a partir dessa base, é antes de tudo um fenômeno ideológico cujas consequências cercam de muitos lados e solidamente a vida de cada ser humano participante; que sua superação subjetiva apenas como ato do respectivo individuo participante pode ser realizada na prática. [...] Terceiro, como já foi igualmente antes enfatizado, há, no ser social, apenas alienações concretas. Alienação é uma abstração cientifica, claro, indispensável à teoria, portanto, uma abstração razoável. Com isso está claro que todas as formas de alienação que são operantes em um período são fundadas, por ultimo, na mesma estrutura econômica da sociedade”.

  • Por fim, o autor destaca o que ele considera um dos traços ontológicos mais importantes do fenômeno da alienação que é a sua processualidade. “Alienação, portanto, nunca é algo ontologicamente estático, mas sempre um processo, que ocorre no interior de um complexo – a sociedade como um todo ou a individualidade humana singular” – separação indivíduo singular e sociedade.

Se efetivamente lemos só os trechos destacados parece que a materialidade é um traço característico da alienação de Lukács, mas o problema está em todas as páginas lidas anteriormente. Quando traz a característica da processualidade é contraditória com toda a exposição anteriormente feita. Se você toma esses trechos parece que há materialidade. Crítica à II internacional > mas ele mesmo foi economicista até aqui.

A leitura do Lukács remete à necessidade de superar alguns “entulhos” de jovem Marx para Marx maduro. O teor desses últimos parágrafos nos autoriza até a dizer que o momento fundamental da alienação é o fundamento/estrutura econômica da sociedade, mas o caráter e o núcleo da dominação de classe parece não estar aí, que ele precisa ressoar em um núcleo ontológico. Isso é difícil de digerir. Por exemplo as demarcações que ele faz como “o fundamento é econômico”, “não é teleológico”, etc., mas na medida que avançamos no texto isso não vai até as últimas consequências. Não dá pra conciliar trabalho estranhado por trás da alienação com trabalho abstrato, subsunção real do trabalho ao capital, etc. O que Lukács escolhe pra fundamentar a alienação são essas concepções idealistas. Daria pra pensar na resolução da alienação do trabalho numa forma social em que o trabalho continue sendo abstrato, nos parece. O que seria inconciliável dentro dos conceitos de O Capital.

Realmente desde o primado das forças produtivas e seu desenvolvimento inexorável, a subsunção real do trabalho ao capital não configura a dominação absoluta do capital, mas uma etapa que mostra que as coisas caminham no sentido correto. O que faz todo sentido pensando no que o Márcio Naves fala de que a forma jurídica se consolida plenamente no processo de subsunção real. Desenvolvimento das capacidades levando ao desenvolvimento das personalidades = subjetividade jurídica alcançando sua forma consolidada. Teoria da alienação leva à afirmação da forma jurídica. Lukacsianos seguem apostando nos direitos humanos como superação da alienação. Lutar pela efetivação da reaproximação e direitos e indivíduos, bens e indivíduos.



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